
— A bula falava algo sobre contraindicação, mas eu estava tão feliz, entusiasmada e… Eu estava tão criança quando resolvi tomar uma daquelas pílulas. E no início é como realmente contaram, é um mar de rosas. Viver um conto de fadas era a promessa do veneno e ele não era propaganda enganosa, mas eram claras as notas sobre a ausência de garantia de finais felizes. Ainda assim precisava me quebrar tanto? Porque toda essa necessidade de me deixar em pedaços tão minúsculos a ponto de eu não enxergá-los e não poder me recuperar sozinha? O pior é que a dor do ferimento se multiplica por cada corte, por cada simples ranhura que deixou em meu coração. Faz parar? Por favor? Prometo não brincar de novo! Mas tira essa agonia que consome cada parte do meu coração na tentativa de fazê-lo parar. Isso dói e eu já não aguento mais! Não aguento mais essa tortura diária de acordar e dormir sentindo falta do que nunca tive, sorrindo com momentos que nunca vivi, relembrando um futuro distante e impossível de protagonizar. Você me fez sonhar tão alto, me deu asas tão grandes, que agora que as cortou eu continuo caindo sem saber quando irei parar. Tá eu assumo, não foi apenas uma pílula que tomei naquele dia como você me recomendou, eu tomei o frasco inteiro! E o sentimento que se construiu em mim por aquele rapaz é maior do que qualquer outra coisa que possa imaginar! Cada parte do meu corpo pede por ele e ninguém jamais vai amá-lo assim, porque não deixei uma só pílula do veneno, entende? E já que não tem antídoto poderia, por favor, me dar aquele outro veneno ali? — A Garota apontou para um pequeno frasco cujo nome escrito à mão em uma fita adesiva dizia: Sono profundo.
Com um misterioso sorriso e olhar sorrateiro o estranho senhor por trás do balcão pegou o frasco e entregou para a jovem. Ela olhou o nome em seu crachá. Amor, era o que tinha escrito nele e então ela guardou na memória para quando acordasse, já sem a dor que agora a consumia, para jamais voltar a brincar com ele. Colocou os comprimidos em sua mão, e um a um foi engolindo com a água que o senhor lhe oferecera. Em movimentos lentos caiu deitada no chão. Olhos fechados, respiração regular, a garota dormia.
— Junie Torres